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Retorno à casa

 

Empurro-me p’ra dentro de mim, fecho a porta.

Vejo trazerem a lamparina, ouço o doce boa noite.

Minha rouca voz menina bem feliz responde: boa.

 

Quisera que minha vida tivesse sido sempre assim:

Dias cheios de sol, de chuva ou suaves como Goiás velha.
Ruas a subirem como se estivessem ressuscitando.

 

É ensinamento falso: responda sempre boa noite.

É mentira: haverá sempre sol, lua como em Goiás.

É mentira o que dizem - criança feliz adulto alegre.

 

Fito a casa colonial. Sutil interesse à porta azul.

Último faro, olhar dado aos muros dos escravos, 
À mangueira, flor, cheiro goiano, pássaro voando.

 

Fechada a porta com trava, candeia apagada.

Nada se lê, mas sempre a ouvir: não pensando,

Nem sentir a vida a escorrer pela palma da mão.

 

Como o rio vermelho límpido corre ao seu leito,

Lá dentro silêncio e ar se perde a todo instante.

Alma se prepara ao terno encontro sem dormir.

 

Vida que se desfaz rio acima bem silenciosamente.

Quem entre nós se sentirá infeliz tendo a casa vazia?

 


Botucatu, 5.IV.1980.

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