
Inaudito ser
Sinto que hão de roubar-me o encanto que não dura
Dos teus olhos que não mais os sinto, mas que me atraem.
Nas horas que me emolduram com tua santa doçura.
Como desfazer-me desse encanto que descai?
Amor que hoje está no tempo incessante prosseguindo,
Nem o inverno leva todo aquele estio a seu tempo certo.
A seiva que congela deixa-me ver as folhas que vão caindo,
Maltratando-me na neblina oculta o teu belo num deserto.
Ah, lembrança do verão do nosso ontem exala graça,
Mas hoje vivo entre os muros de vidros prisioneira.
Ora, nem assim a saudade ardente impede que se desfaça
O rastro de toda a beleza que vivemos a hora passageira.
Deus, mostrai-me que a rosa aniquilada pelo imóvel inverno
Terá guardado no âmago do universo aquele inaudito ser.